Palavras ( Azucena Geymonat Oberdiek)


(M.C. Escher)
 
PALAVRAS
      (Azucena Geymonat Oberdiek*)                                           

“Trabalho. Relaxamento. Não pensar.”
Tal a proposta de Ray Bradbury para quem queira dedicar-se à escrita.
Escrever, escrever, escrever....e escrever.
E me pergunto, mas...o quê?
Considera o escritor que, de tanto escrever, poderão sair, talvez, alguns resultados que mereçam atenção.
Mereçam atenção do leitor....mas por que?
Quem sabe, o escrito toca um ponto sensível no coração ou no fígado; na memória pretérita ou recente; no preciso momento em que os significados essenciais da vida se tornam conscientes.

Eu sinto um chamado para escrever e, quando obedecido, acompanha a sensação de estar verdadeiramente compartilhando algo. Trata-se de um sentimento de ser-eu-mesma, um estado em que me re-conheço e me aprovo.

Lembro-me  de um tempo distante, talvez quando cursava a quinta série da primária que, obstinada em cumprir com a tarefa de redação, fui sentar-me encostada na parede oeste da casa de campo, ao entardecer. Aguardei em silêncio. Os olhos fixos no horizonte, íman chamando aquela bola que, quanto mais descia, mais crescia. O sol, de intensa cor alaranjada, quase brasa, aproximava-se à linha onde finalmente seria engolido.
Meu olhar, meu corpo, meu todo, ali estava imóvel.

Mais uma vez aquela enorme dificuldade de brincar generosamente com as palavras.
Foi assim durante anos. Elas, as palavras, surgiam, mas  a espontaneidade estava muito longe ainda  daquelas páginas quase diário, que expressavam um denso e reprimido conteúdo.

Transcorridos não poucos anos, já fora da vida escolar, as cartas se tornaram um caminho possível para expandir-me. Cartas do Chile e  de Buenos Aires quando lá trabalhei, cartas de uma viagem a Espanha. Cartas cheias de palavras que aos poucos foram flexibilizando tantos sentimentos ocultos no profundo.
Palavras! Essas,  quero soltar, derramar, depurar quiçá.
E se for a diária constância que esta “espiga” demanda para “desgranar”...bem-vinda cada manhã!

                                                                                               
 *Azucena Geymonat Oberdiek  participou do Curso de Escrita Criativa 2016                                       

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